Imagine viver em um lugar onde você não pode morrer, onde o sol some por meses e onde ursos polares podem cruzar o seu caminho a qualquer momento.
Parece um roteiro de filme, mas é a vida real em Longyearbyen, a principal cidade do arquipélago de Svalbard, na Noruega, uma das regiões habitadas mais ao norte do planeta.
Com pouco mais de 2 mil habitantes, Longyearbyen desafia praticamente tudo o que consideramos normal. Lá, não existem cemitérios funcionais, a posse de armas é quase obrigatória, o sol desaparece completamente por quase quatro meses e a cidade abriga um dos lugares mais importantes (e misteriosos) do mundo: o Svalbard Global Seed Vault, conhecido como “cofre do fim do mundo”.
Mas entre todas as suas peculiaridades, uma das mais curiosas é: é proibido morrer em Longyearbyen.
Por que não se pode morrer em Longyearbyen?
A resposta está no solo. Toda a região é composta por permafrost, um tipo de solo que permanece congelado durante o ano todo, mesmo nas estações mais “quentes”.
Isso significa que corpos enterrados não se decompõem naturalmente, permanecendo praticamente preservados por décadas. Na prática, isso impede o processo natural da morte e representa um risco sanitário.
Nos anos 1990, pesquisadores encontraram em corpos enterrados décadas antes fragmentos do vírus da gripe espanhola de 1918 ainda ativos. Isso acendeu um alerta: e se outras doenças “hibernadas” ali voltassem a circular?
Desde então, a cidade adotou uma política clara: pessoas com doenças terminais são transferidas para o continente norueguês, e ninguém pode ser enterrado por ali.
Se alguém morre na cidade — o que ocasionalmente ainda acontece —, o corpo é removido e transportado por avião ou navio para outro local.
Um cemitério congelado no tempo
Apesar de ainda existir um pequeno cemitério na cidade, ele não recebe sepultamentos há mais de 70 anos. Os túmulos antigos continuam ali, congelados no tempo — e no gelo — como se fossem cápsulas da história.
Mas isso não torna Longyearbyen um lugar menos humano. Pelo contrário. A consciência da fragilidade da vida ali é levada muito a sério.
Uma cidade entre extremos: noite eterna e sol sem fim
Outro fenômeno que chama atenção é o comportamento da luz solar.
Em Longyearbyen, o ano se divide em dois extremos:
De final de outubro até fevereiro, o sol desaparece completamente. É o que chamam de noite polar. Durante esse período, a cidade vive sob escuridão total, com apenas a luz da lua, das estrelas e das auroras boreais iluminando o céu.
Essa ausência de luz afeta profundamente o sono e o humor dos moradores. Para enfrentar, muitos usam luz artificial especial dentro de casa e criam rotinas muito rígidas para manter o equilíbrio mental.
Por outro lado, de maio até agosto, acontece o sol da meia-noite: o sol não se põe nunca. Ele circula o céu em movimentos laterais, iluminando a cidade 24 horas por dia. É comum ver pessoas caminhando às 3 da manhã como se fosse meio-dia.
Esses fenômenos tornam Longyearbyen um laboratório natural para estudos sobre ciclos circadianos, saúde mental e adaptação humana ao ambiente.
O cofre do fim do mundo
Longyearbyen também abriga um dos locais mais importantes do planeta: o Svalbard Global Seed Vault, uma espécie de “banco genético” subterrâneo.
Ali estão armazenadas mais de 1 milhão de sementes de plantas de todos os continentes, protegidas contra desastres naturais, guerras ou mudanças climáticas.
O local foi construído para resistir até mesmo a uma catástrofe nuclear, funcionando como uma espécie de “backup da agricultura mundial”.
O cofre foi criado com a missão de preservar a biodiversidade alimentar da humanidade. E Longyearbyen foi escolhida por sua localização estável, remota e… congelada.